Complexo da Reitoria da UFPR

Confira abaixo a íntegra de denúncia protocolada na última terça-feira (29/11) junto à Comissão de Ética da UFPR.

O documento trata do episódio de censura no site da universidade, ocorrido no final do último mês de outubro.

Para saber mais a respeito desse episódio, leia os links abaixo:

Promoção pessoal e censura nos veículos de comunicação da UFPR

Promoção pessoal e censura nos veículos de comunicação da UFPR (parte 2)

Dez dias depois, reitor da UFPR ainda não responde questionamento

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ÉTICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ 

FERNANDO CÉSAR BORBA DE OLIVEIRA, jornalista, diretor de Ação e Cidadania do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor-PR), matrícula […] vem, pelo presente instrumento, com fulcro nos itens XIV (letras “i” e “m”) e XV (letras “a”, “c” e “f”) do Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do poder Executivo Federal, artigos 2º (inciso “V”), 6º (incisos “I”, “II”, “III”, “IV”, “VII” e “VIII”), 7º (inciso “III”) e 14 (inciso “II”) do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, e artigos 5º (inciso “IX”) e 220 (parágrafo 2º) da Constituição Federal, oferecer

                                                DENÚNCIA

 Em face de ANA PAULA MORAES, chefe interina da Assessoria de Comunicação Social, e ZAKI AKEL SOBRINHO, reitor da UFPR, pelos fatos que em seguida passa a expor:

DOS FATOS

No último dia 20 de outubro de 2011, na condição de jornalista da ACS, enviei duas perguntas simples a cada uma das três chapas que na ocasião disputavam a eleição do Sinditest-PR, entidade que representa, entre outros, os servidores técnico-administrativos da UFPR e os funcionários da Funpar.

As duas perguntas eram exatamente as seguintes: 1) “Qual a avaliação da chapa a respeito da atual gestão do Sinditest-PR?; e 2) “Quais as principais propostas da chapa?”

Cada uma das três concorrentes deveria responder com no máximo 800 caracteres a cada pergunta.

Todos os e-mails foram enviados simultaneamente às três chapas. O prazo dado para as respostas venceria na tarde do dia 25.

Horas antes de vencer esse prazo –quando duas chapas já haviam respondido à entrevista–, um dos integrantes da chapa 1, Antônio Néris, informou por telefone que não responderia, alegando que as perguntas seriam “tendenciosas” e “capciosas”, e que supostamente “favoreceriam a oposição”.

Em seguida, Néris telefonou para a chefe provisória da ACS, Ana Paula Moraes, que na sequência me ligou, repetindo a mesma alegação do candidato a presidente da chapa 1.

Transmiti à chefe interina a mesma argumentação que expus ao candidato: 1) Não havia favorecimento algum nas duas perguntas. Genéricas, elas são questões abertas para que cada chapa possa, de forma objetiva, apresentar um diagnóstico da atual conjuntura do sindicato e, em seguida, elencar algumas de suas principais propostas de campanha. 2) Além disso, havia interesse real por parte da categoria representada pelo Sinditest-PR em relação ao processo eleitoral em curso.

Para minha surpresa, a reportagem foi simplesmente apagada[1] do portal da UFPR, no dia 26 de outubro, momentos após ter sido postada.

Ainda não consegui apurar se essa decisão de censurar o texto partiu exclusivamente da chefe interina da ACS, do próprio reitor da UFPR ou então de algum de seus outros assessores.

O fato é que houve censura. E essa prática é inadmissível no contexto da comunicação, especialmente dentro de uma instituição pública, e menos ainda dentro de uma universidade. Ou então a UFPR passou a ter gestores que se consideram donos da instituição?

Lamento não apenas o ato de proibir a circulação de um texto jornalístico pela eventual inconveniência a interesses de grupos específicos. Lamento também a falta de resposta aos questionamentos que fiz por escrito, via e-mail, à chefia da ACS.

Verbalmente, após eu insistir em questioná-la, ela alegou apenas que “não cabe à comunicação da UFPR entrar na briga do sindicato” e que a entrevista com as chapas “afetaria o caráter institucional do site da UFPR”. Ora, então existem temas que são tabus dentro da universidade? O espaço universitário não deveria ser o espaço do livre debate e da pluralidade de ideias por excelência?

No dia 31 de outubro, protocolei ofício ao gabinete do reitor –até hoje sem resposta– solicitando esclarecimentos detalhados, por escrito, quanto ao fato ocorrido. Quem decidiu pela censura? Com quais argumentos? Atendendo a quais interesses?

A seguir, a íntegra do ofício que segue sem resposta:

Curitiba, segunda-feira, 31 de outubro de 2011.

Ao magnífico reitor da UFPR
Zaki Akel Sobrinho

Prezado senhor,

Respeitosamente solicito esclarecimentos detalhados, por escrito, quanto a um fato ocorrido na última semana dentro da ACS (Assessoria de Comunicação Social) da UFPR.
Caso o senhor ainda não tenha sido informado a respeito, segue um breve relato do caso.
Na noite da última quarta-feira (26), uma reportagem acerca da eleição em curso no Sinditest-PR foi simplesmente retirada da capa portal da UFPR para, em seguida, ser apagada.
Segue em anexo a este ofício uma cópia do referido texto, que consistia numa entrevista de duas perguntas, idênticas, formuladas a cada uma das três chapas que participam do pleito.
Quem exatamente decidiu pela censura? Com quais argumentos?
A prática da censura é inadmissível no contexto da comunicação, especialmente dentro de uma instituição pública, e menos ainda dentro de uma universidade.
Escrevo este ofício porque a atual chefe interina da ACS declarou que não responderá nenhum dos e-mails que enviei a ela sobre o assunto.
Registro meu pedido para que o mesmo conteúdo censurado seja recolocado no ar, e que a UFPR produza uma nota pública de esclarecimento sobre todo esse lamentável episódio.
Aproveito para requerer uma cópia, em formato impresso ou mesmo eletrônico, da versão atual do anteprojeto que prevê a reestruturação da ACS, o que inclui a instalação de conselhos de comunicação na UFPR.

Atenciosamente, aguardo resposta.

Fernando César Oliveira
Jornalista da Assessoria de Comunicação Social da UFPR e diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor-PR).

Vale registrar que a mesma pergunta agora atacada pelo candidato a presidente da chapa 1 já havia sido feita na eleição anterior do próprio Sinditest-PR.

No arquivo do site da UFPR é possível acessar uma entrevista com as chapas que disputavam o sindicato em novembro de 2009. Cobertura similar foi feita na eleição de 2010 do DCE.

Desde o ato de censura praticado em 26 de outubro, a única reação dos atuais gestores da UFPR foram as seguintes retaliações:

1)   Bloquearam (ou apagaram) minha conta de usuário que dava acesso ao sistema de gerenciamento do site da universidade; e

2) Retiraram minhas atribuições de editar matérias e de orientar a produção de textos pelos estagiários de jornalismo.

Essas retaliações, que seguem até hoje, configuram a prática de assédio moral.

DO DIREITO

Consta do Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal:

 

XIV – São deveres fundamentais do servidor público:

[…]

i) resistir a todas as pressões de superiores hierárquicos, de contratantes, interessados e outros que visem obter quaisquer favores, benesses ou vantagens indevidas em decorrência de ações imorais, ilegais ou aéticas e denunciá-las;

[…]

m) comunicar imediatamente a seus superiores todo e qualquer ato ou fato contrário ao interesse público, exigindo as providências cabíveis;

[…]

XV – É vedado ao servidor público;

 

a) o uso do cargo ou função, facilidades, amizades, tempo, posição e influências, para obter qualquer favorecimento, para si ou para outrem;

[…]

c) ser, em função de seu espírito de solidariedade, conivente com erro ou infração a este Código de Ética ou ao Código de Ética de sua profissão;

[…]

f) permitir que perseguições, simpatias, antipatias, caprichos, paixões ou interesses de ordem pessoal interfiram no trato com o público, com os jurisdicionados administrativos ou com colegas hierarquicamente superiores ou inferiores;

O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros estabelece que:

Art. 2º Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que:

[…] Va obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação, a aplicação de censura e a indução à autocensura são delitos contra a sociedade […]

 

Art. 6º É dever do jornalista:

I – opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos;

II – divulgar os fatos e as informações de interesse público;

III – lutar pela liberdade de pensamento e de expressão;

IV – defender o livre exercício da profissão;

[…]

VII – combater e denunciar todas as formas de corrupção, em especial quando exercidas com o objetivo de controlar a informação;

[…]

XIII – denunciar as práticas de assédio moral no trabalho às autoridades e, quando for o caso, à comissão de ética competente;

[…]

 

Art. 7º O jornalista não pode:

[…]III – impedir a manifestação de opiniões divergentes ou o livre debate de ideias;

 

[…]

Art. 14. O jornalista não deve:

[…]

II – ameaçar, intimidar ou praticar assédio moral e/ou sexual contra outro profissional, devendo denunciar tais práticas à comissão de ética competente”

E faz parte da Constituição Federal do Brasil:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

[…]

 

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º – Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

 § 2º – É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.[…]

DOS PEDIDOS

Agindo assim, os denunciados estão infringindo os itens da legislação citados acima, motivo pelo qual o denunciante requer que, depois de recebida a presente denúncia, e, ao final, julgada procedente, sejam os denunciados citados para responder a todos os seus termos, designando-se dia e hora para interrogatório.

Curitiba, 29 de novembro de 2011.

FERNANDO CÉSAR OLIVEIRA

Jornalista UFPR


[1] A matéria havia sido publicada originalmente no seguinte endereço da web: <http://www.ufpr.br/adm/templates/index.php?template=2&Cod=8312>.